domingo, 10 de dezembro de 2017

Agressividade do crédito faz disparar riscos para as famílias / Carlos Costa avisa banca para travar crédito à habitação

É imperativo e urgente regulamentar a Banca. Mas, também é imperativo e urgente regulamentar O Alojamento Local e 'Global Housebuyers', Gestores Imobiliários estrangeiros que compram para transformar em Alojamento Local ou Residentes não Habituais, que compram como investimento e colocam no Alojamento Local.
O Poder de compra dos investidores Internacionais é muito superior.
OVOODOCORVO

Agressividade do crédito faz disparar riscos para as famílias

O crédito ao consumo está a crescer e as condições dos empréstimos são cada vez mais complexas, contendo verdadeiras armadilhas para os consumidores. Banco de Portugal assume preocupação
"Natália Nunes, coordenadora do Gabinete de Apoio ao Sobre-endividado (GAS) da Deco, considera que “se voltou à forma de contratação praticada antes da crise financeira de 2008”, e considera que “há um claro aproveitamento da iliteracia financeira de muitos consumidores”, o que deveria levar “a uma outra atenção do regulador”.

ROSA SOARES 10 de Dezembro de 2017, 6:49

Nos primeiros nove meses de 2017 foram emprestados, em média, 17,7 milhões de euros de crédito ao consumo por dia. No total, foram concedidos 4800 milhões de euros de novo crédito para compra de carro, electrodomésticos e muitas outras coisas. Um crescimento acima 12% em termos homólogos, e que faz despertar receios de que muitas famílias estão a cair, novamente, numa espiral de endividamento excessivo.

As campanhas de promoção deste tipo de crédito estão por todo o lado: na rádio, na televisão, na caixa do correio, no email e no telemóvel. E são cada vez agressivas, porque estão associadas a ofertas a que é difícil resistir, como saldos em cartão, equipamentos electrónicos, viagens e descontos. A par da forte persuasão, os produtos de crédito estão cada vez mais complexos, de difícil compreensão, mesmo para pessoas com formação superior fora da área da economia e gestão.

Alguns dos produtos têm verdadeiras “rasteiras”, como a proliferação de cartões de crédito com pagamento mínimo mensal de 5% e 10% dos saldos, percentagens que podem ser aumentadas se o cliente se dirigir a uma caixa automática (vulgo multibanco), ou no acto da compra. Pagar 5% ou 10%, ou mesmo 50% do montante em dívida, por mês, é fazer disparar o valor pago em juros.

Por outro lado, rapidamente o cliente atinge o limite de crédito autorizado e logo surge a tentação de subscrever outro cartão. E praticamente ninguém tem noção dos juros pagos, que nos cartões mais recentemente ronda os 16%, mas nos mais antigos podem ficar muito acima dos 20%. E, novidade recente, começam a surgir cartões em que o habitual período sem juros, de 30 a 50 dias, só se aplica a quem optar pelo pagamento fraccionado.

O saldo total do crédito ao consumo não é muito elevado, representava cerca de 20% do endividamento das famílias no passado mês de Setembro (num total de 115.106 milhões de euros), com a habitação a representar os restantes 80%. Mas é este crédito que gera maiores situações de incumprimento, e que está na origem de boa parte das situações de “falência” financeira dos consumidores. Isto porque é frequente as famílias terem vários créditos, nomeadamente através de cartões de crédito, e de subscreverem novos empréstimos para pagar outros já em incumprimento, e esse desequilíbrio chega, em muitos casos, ao empréstimo da casa.

A aceleração deste tipo de crédito, mais de 40% do qual é para a compra de automóveis, fica a dever-se “ao aumento da confiança das famílias, sendo a primeira variável a despertar num cenário de recuperação económica”, explicou ao PÚBLICO Jorge Farinha, professor da Faculdade de Economia do Porto.

A forte concorrência entre bancos para ganhar quota de mercado, um negócio dominado por bancos estrangeiros, leva a práticas que “replicam o que já aconteceu no passado, embora a sinistralidade [incumprimento] tende a ser menor que no pico da crise”, adiantou Jorge Farinha, responsável por várias disciplinas na área de Finanças.

E o que aconteceu no passado foi a assunção de empréstimos que, em face de uma redução de rendimentos, as famílias não conseguiram suportar, entrando em incumprimento, o que leva, no desfecho mais dramático, à perda da casa e ou à insolvência pessoal.

O Banco de Portugal (BdP) começa a olhar com preocupação para o ritmo de evolução do crédito, que resulta de critérios mais flexíveis na sua concessão, nomeadamente na avaliação da capacidade financeira das famílias para cumprirem os encargos assumidos em caso de redução do seu rendimento e num cenário de subida das taxas de juro, que se deverá colocar a partir de 2019. Boa parte do crédito ao consumo tem taxa fixa, ao contrário do que se passa na habitação, que está associado à Euribor, o que acaba por ter um impacto muito elevado no orçamento familiar.

No relatório de Estabilidade Financeiro, divulgada esta semana, o BdP destaca que “os fluxos de novos empréstimos a particulares [consumo e habitação] registaram um crescimento significativo no primeiro semestre de 2017, tendo já superado, em percentagem do rendimento disponível os níveis observados no início do Programa de Assistência Económica e Financeira”, imposto pela “troika”, em 2011. A preocupação do supervisor é bastante maior no crédito à habitação, onde admite tomar medidas para “apertar” alguns critérios de concessão por parte dos bancos, que na prática funcionarão como travão a operações de maior risco.

Recentemente, o BdP aprovou regras que reforçam os deveres das instituições na avaliação dos deveres de solvabilidade, que entrarão em vigor a 1 de Janeiro de 2018, no âmbito de legislação comunitária, que, no entanto, não impedem que o regulador admita tomar medidas complementares. 

Sinais de alerta
A agressividade comercial é acompanhada de uma certa ligeireza na avaliação da capacidade financeira do cliente. Até 1500 euros é frequente encontrar crédito concedido na hora, sem comprovação de rendimentos, e da situação socioprofissional, despesas regulares. Quando muito, dá tempo para uma consulta à Central de Responsabilidade de Crédito, que é uma espécie de cadastro do histórico financeiro do cliente, contendo informação sobre eventuais falhas de pagamento de empréstimos.

Agressivas são também as campanhas de crédito com taxa de juro zero, reflectida na Taxa Anual Nominal, que é a taxa habitualmente promovida, mas pode não ser zero, porque os juros estão escondidos noutros custos, como o de abertura de processo, seguros obrigatórios, comissão de pagamento de prestação, e isso só é reflectido na Taxa Anual de Encargos Efectiva Geral (TAEG), que tem de ser comunicada ao cliente, e tem que estar nos contratos, mas que não é de fácil percepção pelos clientes. 

Natália Nunes, coordenadora do Gabinete de Apoio ao Sobre-endividado (GAS) da Deco, considera que “se voltou à forma de contratação praticada antes da crise financeira de 2008”, e considera que “há um claro aproveitamento da iliteracia financeira de muitos consumidores”, o que deveria levar “a uma outra atenção do regulador”. E os resultados são preocupantes. Natália Nunes refere que “todos os dias chegam ao GAS pedidos de famílias sobre-endividadas e que não há uma diminuição face aos anos anteriores. De Janeiro a 25 de Outubro, o GAS recebeu 26.080 pedidos de ajuda, já perto dos cerca de 30 mil do total do ano passado.

“A situação das famílias não está também como parece”, refere a coordenadora do GAS, admitindo que já é visível uma preocupação de muitas famílias com o impacto que a subida da Euribor pode ter no seu orçamento.

O presidente da Apusbanc Consumo, associação de defesa do consumidor, Júlio Martins-Mourão diz não ter dúvidas que a publicidade do crédito ao consumo “é agressiva e enganosa”, admitindo que há coisas a corrigir, como rápida comunicação à Central de  Responsabilidade de Crédio da entrada em incumprimento dos clientes, que actualmente é de dois meses. Júlio Martins-Mourão também defende medidas rápidas relativamente à formação dos funcionários afectos à venda destes produtos.


A introdução de uma disciplina de formação financeira, a começar no secundário, é fundamental, defende Jorge Farinha, considerando que essa matéria “não é menos importante do que aprender Português ou História”. Da sua experiência pessoal, diz o professor universitário, “há muitas pessoas com formação superior com grande desconhecimento destas matérias”, em boa parte porque a linguagem “é muito inacessível”.


(...) "Outro dos motivos de preocupação do Banco de Portugal é o facto de que "os fluxos acumulados de novo crédito à habitação mantiveram, no primeiro semestre de 2017, uma dinâmica de forte crescimento - cerca de 40% em termos homólogos". Além de que "a percentagem de transações de alojamentos familiares financiadas por recurso a crédito aumentou para 45%, face ao mínimo de 20% em 2013". Em 2009, o valor era de 65%."
"Neste sentido, é importante que as instituições financeiras baseiem as suas decisões de concessão de crédito em análises adequadas da capacidade de serviço da dívida por parte dos clientes, em particular em condições macroeconómicas e financeiras mais adversas", refere.



Carlos Costa avisa banca para travar crédito à habitação

07 DE DEZEMBRO DE 2017
Elisabete Tavares

Banco de Portugal admite dificultar a concessão de empréstimos para a compra de casa para proteger bancos de nova crise
"Fazer um crédito à habitação pode ser mais difícil num futuro próximo. O Banco de Portugal pondera avançar com medidas que vão dificultar a vida a quem quiser pedir um empréstimo para comprar casa. Em cima da mesa, admite, está um aumento de exigências para a concessão de crédito, nomeadamente pedindo mais garantias. Também pode exigir que a taxa de esforço a ter em conta seja mais apertada e contemple a futura subida das taxas de juro na zona euro. Outra medida pode envolver a descida do prazo de duração de um empréstimo. De acordo com o supervisor, Portugal apresenta maturidades mais longas no crédito à habitação face à média da zona euro, aproximando-se dos 40 anos."

"Os fluxos acumulados de novo crédito à habitação mantiveram uma dinâmica forte no primeiro semestre de 2017, com um peso crescente no valor das transações de alojamentos familiares", refere o banco central no seu Relatório de Estabilidade Financeira.

Para o Banco de Portugal, "importa assegurar que as atuais dinâmicas do crédito à habitação e da economia, em particular do mercado imobiliário, não comprometam a redução do ainda elevado rácio de endividamento dos particulares". Por outro lado, o banco central também quer assegurar que não é promovida a "acumulação de risco excessivo no balanço dos bancos e a excessiva afetação de recursos da economia ao setor imobiliário".

Posto isto, "o Banco de Portugal pondera a adoção de medidas adicionais tendo em vista reforçar a avaliação da capacidade creditícia dos mutuários pelas instituições".

Spreads a descer

Um dos sinais de alerta verificados pelo Banco de Portugal é que, nos últimos anos, em particular desde 2015, "observa-se uma compressão dos spreads dos novos empréstimos à habitação, o que reflete, em larga medida, a concorrência entre bancos neste segmento".

Mesmo que os spreads aplicados atualmente "se situem muito acima dos níveis praticados antes da crise, já se encontram em níveis relativamente baixos no contexto da área euro".

Mas, além dos spreads, "outros critérios de concessão de crédito mostram alguns sinais de menor restritividade".

Outro dos motivos de preocupação do Banco de Portugal é o facto de que "os fluxos acumulados de novo crédito à habitação mantiveram, no primeiro semestre de 2017, uma dinâmica de forte crescimento - cerca de 40% em termos homólogos". Além de que "a percentagem de transações de alojamentos familiares financiadas por recurso a crédito aumentou para 45%, face ao mínimo de 20% em 2013". Em 2009, o valor era de 65%.

"Neste sentido, é importante que as instituições financeiras baseiem as suas decisões de concessão de crédito em análises adequadas da capacidade de serviço da dívida por parte dos clientes, em particular em condições macroeconómicas e financeiras mais adversas", refere.

O banco central lembra que, na perspetiva dos particulares, o crédito à habitação constitui habitualmente o maior compromisso financeiro assumido, dados os valores mutuados, o prazo típico de duração dos contratos e as consequências da eventual execução da hipoteca.

A exposição direta e indireta ao mercado imobiliário, por parte da banca, representa cerca de 40% do ativo total do setor bancário. "Esta exposição assume sobretudo uma natureza indireta, principalmente relacionada com crédito a particulares para habitação, o qual é tipicamente garantido por hipoteca do imóvel". Em junho de 2017, o crédito a particulares para habitação representava aproximadamente 28% do ativo total.

Apesar de tudo, os montantes acumulados de crédito à habitação estão a baixar, embora a um ritmo mais lento do que nos últimos anos, devido a amortizações antecipadas e ao vencimento de contratos antigos, que superam os novos contratos. Além de que grande parte do aumento da procura de casas em Portugal vem de investidores estrangeiros, com regimes fiscais favoráveis. E estes compram em dinheiro ou com financiamento no exterior.

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