sábado, 15 de julho de 2017

Sete razões para não votar Fernando Medina nas autárquicas de Lisboa

Nem uma palavra sobre as gravíssimas consequências do “fachadismo” para o Património Arquitectónico de Lisboa. Nem uma palavra sobre os processos imparáveis da Globalização, Gentrificação e Turistificação de Lisboa e desastrosas consequências com a espiral especulativa do Imobiliário e preço da habitação, expulsão dos moradores locais e efeitos nocivos do Alojamento Local “à rédea solta” e sem regulamentação.
Esta "mensagem" é decepcionante, insuficiente e confirmadora dos limites da política profissional …
OVOODOCORVO



Sete razões para não votar Fernando Medina nas autárquicas de Lisboa
É preciso que o PS perca a maioria absoluta e tenha de negociar com forças com efetivo e conhecido peso político-eleitoral.

ANDRÉ FREIRE
15 de Julho de 2017, 7:36

Há um principio básico em democracia, a prestação de contas. O caso do PS/Medina, em Lisboa, aponta em sentido oposto. Ao fim de 10 anos no poder, 2007-2017, estão a fazer todas e mais alguma obra(s) no final do terceiro mandato, como se tivessem chegado anteontem, e tornando a vida dos eleitores num inferno, e uma série de coisas que deveriam ter feito até aqui… prometem-nos agora para o futuro… precisarão de mais 10 anos? Claro que é improvável que percam as eleições em Lisboa, desde logo porque a comunicação social anda praticamente "com ele(s) ao colo". Depois porque as forças partidárias à direita estão de cabeça perdida, e nem fazem oposição que se veja, nem apresentam alternativas sérias e construtivas. Mas seria desejável que recebessem pelo menos um bom castigo eleitoral que os levasse a perder a sobranceria da maioria absoluta atual, tendo de negociar um acordo político com outro(s) partido(s). Pela minha parte, passo a apresentar sete razões para isso.

1. Um eleitoralismo nunca visto e a vida dos lisboetas num inferno

A cidade de Lisboa está um inferno dadas as mil e uma obras praticamente iniciadas todas no último ano de mandato, ao fim de dez anos. Vejamos: têm sido as inúmeras obras no eixo central (Avenidas da República e Fontes Pereira de Melo, Praça do Saldanha e Picoas); há o programa "pavimentar Lisboa", que pretende recuperar os pavimentos para peões e automóveis em 150 ruas; tem sido o programa "uma praça em cada bairro" que obrigará a 31 intervenções em múltiplas zonas; etc., etc. Mostrar trabalho feito em anos de eleições é algo positivo em democracia, algum eleitoralismo é até quiçá positivo, sempre existiu e existirá, mas este nível desmesurado de eleitoralismo, que tem tornado a vida dos lisboetas e seus visitantes muitíssimo desagradável, nunca se tinha presenciado, e é claramente pernicioso. Para um partido que está há dez anos no poder fazer tantas obras no décimo ano de mandato, várias questões se colocam. Será mau planeamento? Será má gestão? Estarão a extravasar o mandato político de 2013? Qualquer resposta positiva é um problema, teme-se que sejam todas.

2. O fundamentalismo contra os automóveis

Há um evidente extremismo na forma de conceber e operacionalizar a ideia de uma cidade sem carros. Quem vir as obras em várias zonas da cidade verificará que há um crescimento desmesurado dos passeios e uma redução igualmente desmesurada das vias para circulação automóvel. Vias mais amigas dos peões e dos utilizadores de bicicleta são uma coisa boa, do meu ponto de vista, mas tal objetivo deve ser prosseguido com equilíbrio e moderação porque há moradores no concelho de Lisboa, muitos deles têm carro e, do meu ponto de vista, têm direito a terem os seus automóveis e a terem lugares de estacionamento em número suficiente e a preços razoáveis nas zonas onde residem. Mais, deve ser a câmara a providenciar isso mesmo, nomeadamente com parquímetros em todas as zonas da cidade, e com tarifas substancialmente reduzidas para os moradores. Não é isso que é feito: a câmara parece querer obrigar os moradores a venderem os seus carros, tal é o extremismo e a falta de moderação na conceção e implementação da ideia de uma cidade sem carros.

3. A incoerência nas políticas

A vertigem de uma cidade sem carros e quase só povoada por transportes públicos e bicicletas esbarra na ausência de infraestruturas próprias para isso, para além de um voluntarismo político verdadeiramente alucinado quanto ao grau de utilização de bicicletas pelos lisboetas e seus visitantes, seja para lazer, seja (ainda pior) para utilização diária casa-trabalho. Por um lado, não há pistas a ligar toda a cidade, e as mais antigas (iniciadas pelo então vereador José Sá Fernandes, 2007-2009) estão no mais perfeito abandono. Por exemplo, agora há umas belas pistas, faustosas mesmo, desde entrecampos até ao Marquês de Pombal, mas depois quem quiser ir daqui até ao Terreiro do Paço esbarra com a total ausência de pistas… vai pelos passeios? Ou no meio do infernal e perigoso trânsito? E do Terreiro do Paço até ao Oriente, ou do Oriente até Telheiras, há pistas, sim, mas estão totalmente ao "deus-dará". Para uma utilização abundante de bicicletas é preciso pistas ligando todas as partes fundamentais da cidade como, por exemplo, em Viena. E, mais importante ainda, é preciso postos abundantes para aluguer de bicicletas como nas principais cidades europeias. Que eu saiba ainda só existem meia dúzia, quiça uma dúzia, no Oriente… Ou seja, querem não só que as pessoas vendam os carros que têm, mas também que comprem bicicletas?

4. A inconsistência nas políticas

Problemas semelhantes ocorrem com a falta de condições efetivas e incentivos positivos para uma menor utilização dos automóveis: falta um claro e prévio reforço dos transportes públicos, falado para um futuro próximo… faltam parques dissuasores à entrada da cidade, a preços simbólicos, para as pessoas não trazerem os carros para dentro da cidade. Dizem que vão fazer a seguir… faltam parquímetros em todas as zonas da cidade, nomeadamente nos bairros periféricos (Benfica, etc.), que protejam os moradores (com preços simbólicos para eles) e impeçam os de fora de trazerem o carro para dentro da cidade. Dizem que vão fazer a seguir… e, mesmo assim, apesar de a EMEL ter isso nos seus planos, logo vem a presidente da Junta de Freguesia de Benfica (PS) dizer que ainda terá de se ver se avança mesmo…

5. Prometer para o futuro o que deveria pelo menos ter começado em dez anos

Seja no ausente reforço dos transportes públicos, seja na insuficiente rede de pistas de bicicletas, seja nos escassos parques dissuasores, ou na quase total ausência de parquímetros (dissuasores) nos bairros periféricos da cidade… dizer que se vai fazer a seguir, para um partido que está há dez anos no poder, é de uma total desfaçatez e de uma absoluta falta de sentido de prestação de contas… já para não falar da colossal incoerência e inconsistência das políticas… E o cenário repete-se com a desertificação do centro da cidade e/ou com a falta de habitação a preços minimamente acessíveis para os jovens e as classes assalariadas.

6. As obras de fausto e o tratamento desigual das várias zonas da cidade

Fazem-se obras de fausto nalgumas zonas, como nas Avenidas da República e Fontes

Pereira de Melo, com magnificas pistas de bicicletas e generosíssimos passeios, mas depois não há continuidade nas pistas de bicicleta e o trânsito transforma-se num inferno pior que o atual. Fazem-se sumptuosas intervenções nalgumas áreas, como na remodelação do Parque em frente ao Fonte Nova, mas depois noutras zonas de Benfica, como por detrás da Igreja ou da Avenida do Uruguai, continuam as ruas todas esburacadas e imensas zonas em terra batida. Má gestão? Iniquidades? Sim, claro, ambas as coisas.

7. A sobranceria da maioria absoluta

Quando o Bloco de Esquerda era crucial para se constituir maioria (relativa, porém), 2007-2009, ou quando os Cidadãos Por Lisboa (CPL) eram uma força chave para se constituir uma maioria absoluta, 2009-2013, a ação do PS era efetivamente moderada pelos seus parceiros de coligação… Mas quando o CPL passou a estar na mesma lista do PS, 2013-2017, e a serem dispensáveis para formar maioria absoluta… acabaram os freios à absolutização do poder… O regabofe foi descrito acima, sem que o CPL tenha sido capaz de o refrear… Agora, em 2017, apresentam-nos no mesmo bilhete PS, CPL e LIVRE, ou seja, o PS com duas forças políticas relativamente fracas e, sobretudo, cuja força eleitoral se desconhece desde sempre em Lisboa (LIVRE), ou pelo menos desde 2013 (CPL). Logo, os dados estão lançados para o PS "os meter no bolso", sobretudo se tiver maioria absoluta. Para acabar com a sobranceria da absolutização do poder e com a falta de sentido de prestação de contas, é preciso que o PS perca a maioria absoluta e tenha de negociar com forças com efetivo e conhecido peso político-eleitoral, como o BE e o PCP-PEV.


 Politólogo, Professor de Ciência Política no ISCTE-IUL.

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