sexta-feira, 14 de abril de 2017

"Vamos limitar as entradas na Torre de Belém no verão"


"Vamos limitar as entradas na Torre de Belém no verão"

Há pouco mais de um ano à frente da Direção-Geral do Património Cultural, Paula Silva defende o papel do património como elemento dinamizador da economia e do desenvolvimento regional. Fala com satisfação do aumento de visitas neste primeiro trimestre do ano e garante que apenas a Torre de Belém já atingiu a sua capacidade máxima.

15 DE ABRIL DE 2017
Marina Marques

Em 2016 os monumentos sob a tutela direta da DGPC receberam mais de 4,3 milhões de visitantes, o número mais alto de sempre. Este parece-me um bom ponto de partida, uma vez que o tema deste Dia Internacional dos Monumentos e Sítios é património cultural e turismo sustentável. Como se equilibra este binómio?

Já temos dados deste primeiro trimestre e houve um aumento de 10% relativamente ao ano anterior. O que significa que a procura do património depende da tutela da Direção Geral do património (DGPC) continua a crescer, o que nos dá uma grande felicidade. Este aumento do turismo tem contribuído decisivamente para o melhoramento da nossa economia e por isso temos de estar contentes com isso. E o património é também um elemento fundamental neste desenvolvimento económico pela riqueza, direta e indireta que traz ao nosso país. Por outro lado, o nosso universo de turismo, mesmo assim, está muito aquém dos níveis europeus. O que há é um aumento rápido e os alertas que existem de alguma cidades da Europa, nomeadamente Barcelona e Veneza, chegam cá e levam a que as pessoas pensem nestas situações. O fundamental, e penso que esse deve ser o objetivo que devemos perseguir, é diversificar a oferta turística e disseminá-la dentro das cidades e pelo território.

E de que forma?

A criação de redes, de rotas, de estruturas capazes de atrair o turismo para outros locais para além dos mais óbvios é que absolutamente fundamental e é uma questão estrutural, de desenvolvimento do território, que vai para além do património e da cultura. Isso não quer dizer que a DGPC e as direções regionais de cultura não tenham consciência desta conjuntura objetiva e não estejamos a trabalhar e a melhorar a oferta no país, algo que também cabe aos municípios.

Existe, portanto, um equilíbrio saudável ainda. Mesmo no caso da Torre de Belém?

Posso dizer-lhe, por exemplo, que no caso da Torre de Belém vamos limitar o número de entradas diárias nos meses de maior fluxo turístico. Não sei ainda em que termos, mas já estamos a trabalhar nisso. Provavelmente vai ser um limite de pessoas de hora em hora. Outra medida relativamente simples de ser feita também é retirar a Torre de Belém dos bilhetes conjuntos de entrada em vários monumentos. A Torre de Belém é, de facto, entre os monumentos, palácios e museus que estão debaixo da responsabilidade da DGPC aquele que vai exigir esse rácio de pessoas para o conforto delas próprias e, principalmente, para a conservação e segurança. É um monumento pequeno, delicada e frágil e, portanto, tem de ser tratado em consonância.

Na quarta-feira, na Assembleia da República, o ministro da cultura anunciou que está a ser feita uma listagem de imóveis de interesse público do país para definir quais os que ficam sob a alçada das autarquias e quais ficam dependentes do Governo. Que imóveis são esses?

Essa lista está em trabalho. Há alguns anos iniciou-se um processo de descentralização da cultura com a criação das direções regionais e, em simultâneo, também houve a passagem de muito património para os municípios (castelos e fortalezas, por exemplo). Isto não é, portanto, um processo novo, já existiu e pretende-se continuado. A DGPC e as DRC elaboraram uma lista de património que pode passar para os municípios. Está feita, obedeceu a critérios.

E que critérios são esses?

Estamos a falar de património do Estado. E mesmo dentro do património do Estado, tudo o que é património religioso não pode ser afeto aos municípios pela Lei da Concordata. Por isso, estamos a falar de fortalezas e castelos que tinham um caráter militar e perderam a sua função, vários edifícios que pertenciam ao Ministério da Defesa, hospitais ou ligados à Marinha (fortes de costa, por exemplo). Estamos também a trabalhar no Revive, outra forma de reabilitar património, trata-se de concessão, nunca passando de propriedade. É importante perceber que nas décadas de 70, 80 e 90 houve um grande esforço do Estado para reabilitar os grandes conventos e mosteiros, tendo-se inclusivamente comprado a privados partes desses mosteiros para os reabilitar e para os transformar em estruturas visitáveis. Foi o caso do Mosteiro de Tibães, do Mosteiro do Pombeiro, Rendufe, São João de Tarouca. Esses trabalhos, de uma forma geral, já estão concluídos.

Entretanto, nestas últimas décadas houve, através de fundos europeus, a possibilidade de construir equipamentos novos para serviços que ocupavam edifícios antigos (conventos e mosteiros), levando ao seu abandono. Hospitais psiquiátricos, escolas, escolas profissionais, quartéis... Tive consciência disso precisamente por causa do Revive. É o caso de um edifício fantástico e emblemático que é o Mosteiro de Santa Clara de Vila do Conde. É esse património para o qual é preciso arranjar nova função.

Uma das necessidades absolutas para que esse património se mantenha é reutilizá-lo e aqui as câmaras entram muito bem porque podem aí instalar equipamentos seus e têm um conhecimento do território muito grande que pode permitir que haja uma utilização de espaços que neste momento não estão a ser ocupados.

De 2016 para 2017 o orçamento da DGPC passou de 14,7 para 16,7 milhões de euros. Esse reforço vai servir para alguns projetos em particular?

Tivemos um reforço mas depois tivemos cativações. Temos um reforço importante, e esse foi um objetivo do ministro da Cultura, para podermos transferir mais dinheiro para a Fundação do Museu do Côa o que permitirá que não viva naquele terror da falta de dinheiro e consiga ter uma programação e atividade regulares. É um museu no interior, numa região que já está a ter turismo por estar classificada como Património da Humanidade e o Museu do Côa pode ser extremamente importante do ponto de vista do turismo cultural.

Que candidaturas estão em curso no âmbito do Portugal 2020?

Temos Conímbriga. É um museu antigo, que nestas grandes reformas nunca teve intervenção. Está prevista a ampliação do museu com a criação de uma zona de exposições temporárias que não tem atualmente e o melhoramento do circuito de visita da estação arqueológica da cidade de Conímbriga, com uma ligação a Condeixa Velha num quadro de parceria com a Câmara Municipal. Há também o projeto para a Sé de Lisboa, que está neste momento para lançamento do concurso público para início da obra. E depois há um projeto da zona centro, que inclui os três monumentos classificados como Património da Humanidade (Mosteiro de Alcobaça, Mosteiro da Batalha e Convento de Cristo). Neste caso, o que se pretende é fazer algumas obras de conservação e melhorar as condições de visita do público, sobretudo novas portarias. Fizemos também um projeto, em parceria com o Turismo do Centro e com os municípios, para dinamizar a programação cultural para aqueles três monumentos.

Temos outros projetos em andamento, como uma candidatura para arqueologia subaquática que passa pela georreferenciação do património subaquático. E estamos de olhos bem abertos à procura de todas as oportunidade que surjam para candidatarmos projetos, não só ao Portugal 2020, e procuramos mecenatos, tudo.

Fortaleza de Peniche. Foi nomeado um grupo de trabalho para apresentar propostas sobre usos possíveis para a Fortaleza. Já há alguns resultados? Os três meses estão a terminar...

O grupo de trabalho vai entregar ao senhor minsitro o documento que elaborou, nos próximos dias, provavelmente na próxima semana. Só depois será comunicado o seu conteúdo. Penso que o senhor ministro o fará pela altura do 25 de Abril.

E as obras no Palácio da Ajuda, estão a andar segundo o previsto?

Sim, estamos a seguir o cronograma previsto. Neste momento já se vê alguma movimentação no Palácio da Ajuda. São sondagens geotécnicas para se perceber como poderão ser realizadas as fundações. E está previsto o concurso da obra ser lançado no segundo semestre. E lá está, este será um projeto importante na medida em que vai, nesta zona do eixo Belém-Ajuda, atrair um conjunto grande de pessoas para uma quota mais alta e onde elas vão com dificuldade. Temos alguma dificuldade em fazer com que as pessoas subam à Ajuda e subam ao Museu de Etnologia. Estamos convencidos que a exposição permanente das Joias da Coroa vai atrair um público à quota alta. Pode até vir a haver um transporte que facilite esse movimento. E se houver procura desse transporte, qualquer empresa já vê isso como uma possibilidade de negócio. Aliás, viu-se o resultado interessantíssimo o ano passado, da parceria com a Volkswagen que disponibilizou carrinhas na Noite dos Museus, e que teve uma procura de tal forma que se formaram filas medonhas.

Este ano haverá novamente essa parceria?

Estamos a trabalhar para isso. E até a tentar reforçar porque o número de visitantes [na noite dos museus] subiu exponencialmente em relação a anos anteriores.

Alguma perspetiva de quando pode avançar a gratuitidade dos museus e qual o seu impacto?

Fizemos o estudo do impacto económico, já enviado para o Ministério das Finanças, e deverá ser implementado proximamente.

E qual é o impacto desta medida?

Mesmo aplicando-se só para cidadãos nacionais, tal como decidido na Assembleia da República e vertido no Orçamento de Estado, o impacto vai ser forte.

O que se passou com a exposição Lisboa, Cidade Global, em que os procedimentos burocráticos atrasaram o início da exposição é uma situação que vai voltar a repetir-se ou estão a ser tomadas medidas no sentido de agilizar os procedimentos necessários nestes casos?

Os procedimentos são mais difíceis na administração central pública na medida em que obrigam a regras mais apertadas e diversas tutelas têm de se pronunciar. O que temos é que antecipar os procedimentos, planear a mais longo prazo. E em relação às exposições, às vezes é difícil fechar a longo prazo quando dependem de empréstimo de peças.

Em janeiro, fez um ano que aqui chegou. O que considera a sua grande obra?


Não vejo isso assim. É uma grande responsabilidade que entendo com espírito de serviço público que tenho. E gosto do trabalho que estou a fazer. Uma das coisas que queremos é melhorar a comunicação da direção geral para que apareça pelas questões boas e não só por adiamento de exposições. Mas posso dizer-lhe que me deu muita satisfação abrir o Museu de Arte Popular, que estava fechado já há vários anos, e o projeto que está neste momento em marcha para em outubro criamos um programa museológico, consistente. E claro, também, o ter conseguido desbloquear a questão do Museu dos Coches que vai abrir com a nova museografia no dia 19 de maio e a ponte pedonal vai finalmente começar a ser construída. Na minha opinião, o museu nunca devia ter sido aberto naquelas condições. A ponte vai ser muito importante para as questões de estacionamento e para a passagem para o novo MAAT mas também é fundamental para o remate do edifício do arquiteto brasileiro Paulo Mendes da Roch que, neste momento tem um edifício que não está bem do ponto de vista da arquitetura. A ponte pedonal é uma obra longa, de mais de 400 dias, complexa porque passa por cima de um caminho de ferro e uma via de muito tráfego.

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