terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Os responsáveis pela morte do 7º banco português /Nicolau Santos / Portugueses já deram 13 mil milhões para salvar bancos

Os responsáveis pela morte do 7º banco português

(Nicolau Santos, in Expresso Diário, 21/12/2015)
EXPRESSO online

O Banif fechou ontem as portas para sempre. É a morte do banco fundado por Horácio Roque, que não merecia que a sua memória fosse manchada por este colapso. Mas não se chegou aqui por acaso. A gestão política do caso feita pelo Banco de Portugal, em conivência com o anterior Governo, conduziu a este fim.

O governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, deve uma explicação aos portugueses. Deve uma explicação pela estratégia que seguiu na resolução do BES e na venda do Novo Banco, que falhou rotundamente e que para já está a custar aos contribuintes pelo menos 3,9 mil milhões de euros. E deve uma explicação pela gestão que fez do caso Banif, e que pelo menos vai custar 2,4 mil milhões aos contribuintes. Tudo somado, Carlos Costa já passou uma fatura aos portugueses de 6,3 mil milhões de euros. No mínimo tem de explicar-se.

Mas não só ele. A anterior ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, também deve uma explicação aos portugueses. O Ministério das Finanças tem a tutela do sector. O que fez Maria Luís desde dezembro de 2012, quando pela primeira vez a DGCOM defendeu a extinção do Banif? Como foi possível passarem dois anos e nove meses sem serem tomadas decisões que impedissem o fim do sétimo maior banco português? E o anterior primeiro-ministro também não sabia de nada? Ninguém lhe disse o que se passava?

O que parece ter acontecido é que, primeiro, Maria Luís não dedicou nenhuma atenção ao assunto (aliás, considerava Jorge Tomé, presidente do Banif, “o Varoufakis português”). Depois, com o caso BES/Novo Banco, a sua enorme preocupação (e a de Passos Coelho) foi afastar o mais possível o Governo da fogueira e empurrar tudo para cima do Banco de Portugal e do governador, estratégia com que este, ativa ou passivamente, foi obviamente conivente. E com a aproximação das eleições de 4 de outubro deste ano, o que Passos e Maria Luís não queriam de todo era que fosse necessário a resolução de mais um banco, pelo que o assunto foi varrido para baixo do tapete.

Agora chegou a fatura, como sempre para os mesmos. São pelo menos 2,4 mil milhões, a que se juntam os 3,9 mil milhões que já estão no Fundo de Resolução por causa do BES/Novo Banco. Alguém tem de responder por isto. E não é a gestão do Banif que, como admite o Banco de Portugal, conseguiu “a redução de custos de estrutura e, até ao final de 2014, a melhoria da posição de liquidez com a diversificação das fontes de financiamento e a estabilidade da base de depositantes”. Uma estabilidade que foi comprometida quando, há uma semana, uma notícia da TVI, dando nota da possibilidade do banco fechar as portas, provocou uma corrida aos depósitos, com o levantamento de quase mil milhões de euros numa semana, sem que o Banco de Portugal tomasse qualquer decisão concreta para travar a hemorragia.

Não, no fim do Banif há culpados, sobretudo por omissão e pela gestão política do processo. No mínimo é essencial que eles se expliquem no Parlamento.


Portugueses já deram 13 mil milhões para salvar bancos
22 DE DEZEMBRO DE 2015
Luís Reis Ribeiro
DN online

Desde 2007 a ajuda pública ao setor financeiro equivale a 7,3% do PIB e a um ano de receito do IVA

No pior cenário de todos - que não é rejeitado pelo governo, nem pelo Banco de Portugal, nem pela Comissão Europeia -, os contribuintes portugueses podem perder de forma definitiva 2500 milhões de euros de ajudas concedidas no resgate ao Banif, se tudo correr mal na venda dos ativos de qualidade duvidosa que ficaram sob o manto do Estado português.

A única parcela que estará mais ou menos segura são os 489 milhões de euros agora emprestados ao Fundo de Resolução (controlado pelos bancos nacionais, que devem devolver o dinheiro com juros), embora até aqui haja dúvidas.

Ou seja, 84% da exposição total ao banco madeirense (total de três mil milhões de euros, contando já com as ajudas de 2013 e 2014) é arriscada e pode ficar no défice e na dívida para sempre. Somando isto aos dez mil milhões de euros que já foram ao défice entre 2007 e 2014 em forma de ajudas ao setor financeiro - BPN, BES, BPP, recapitalizações da CGD, que teve de absorver perdas avultadas do BPN, etc., mais juros sobre isto tudo - Portugal tem empatados até agora 13 mil milhões de euros nos bancos. São 7,3% do produto interno bruto (PIB), quase um ano inteiro de cobrança de IVA, por exemplo.

Nas Finanças há algum amargo de boca. A venda foi feita tarde e a más horas e o único comprador capaz de avançar, o Santander, impôs condições duras para aceitar ficar com parte do Banif: pagou 150 milhões de euros pelo negócio bom do Banif e terá ficado ainda com certas responsabilidades (créditos imobiliários mais arriscados, valores ligados a sucursais estrangeiras, algumas em zonas offshore).

Aqui, o Estado, além da megainjeção de capital (2255 milhões de euros, 825 milhões vêm do tempo do PSD-CDS), avançou com 745 milhões de euros em garantias ao veículo que fica a gerir os ativos e ao próprio comprador. O seu valor é anormalmente elevado porque os ativos duvidosos foram assumidos com 75% de desconto (haircut). Uma condição da Europa.

Demora e inconclusão

Mário Centeno culpou a "demora" e os "demasiados acontecimentos inconclusivos" que ocorreram durante a gestão do anterior governo e do Banco de Portugal, dizendo que esse arrastamento acabou por "aumentar os custos finais" e muito. Os sucessivos obstáculos da Direção-Geral da Concorrência, que nunca foi partidária da entrada do Estado em 2013, também são vistos como lesivos. Agora, "a minimização do custo [do caso Banif para o Estado] depende muito da forma como se vai operar" a venda dos ativos de qualidade duvidosa, explicou ontem Mário Centeno, ministro das Finanças.

Mais défice, mais dívida, etc.

Para já, o governo sabe apenas que o défice público deste ano sobe para "cerca de 4%" do PIB, quando o limite do pacto orçamental europeu é 3%. O auxílio ao Banif não vai contar para a meta oficial, acredita o governo.

Retificativo de 2255 milhões

Mas numa lógica de caixa (dinheiro que realmente sai e entra), o défice aumenta porque a despesa deste ano sobe 2255 milhões de euros de uma assentada. Será financiada com mais dívida. Para o fazer, as Finanças enviaram ontem uma proposta de Orçamento Retificativo para 2015 em que pedem essa autorização ao Parlamento. O diploma será debatido e votado amanhã de manhã.

Para aguentar o "custo muito elevado" (como disse António Costa) do resgate ao Banif, o Tesouro tem de ir ao mercado buscar mais dinheiro. Ou então, no limite, não vai e usa parte da almofada de segurança dos depósitos. Será certamente desaconselhado a fazê-lo por algumas das instituições da troika.

Se a dívida subir, como se perfila, todos os portugueses vão pagar mais juros nos próximos anos. O rácio da dívida pública está em 130% do PIB, sendo um dos maiores da Europa e violando as regras do novo tratado europeu.

Ontem, como no BES ou BPN, houve desfile de números. Segundo Bruxelas, que deu luz verde à solução final, "as autoridades portuguesas notificaram a Comissão dos planos de concessão de 2255 milhões de euros em medidas de auxílio destinadas apoiar a venda de ativos e passivos do Banif ao comprador". Esta é a injeção de capital propriamente dita. Os 489 milhões do Fundo de Resolução estão incluídos.

Uma vez mais, este fundo estava sem verba, os bancos que o suportam também, aparentemente, pelo que é novamente o Estado a conceder-lhe um empréstimo. Além disso, há um auxílio de 422 milhões de euros "destinado à transferência de ativos para o veículo de gestão". Quanto mais difícil for a recuperação dos ativos, mais o Estado será chamado a pagar. A garantia vai sendo executada com prejuízo para o contribuinte.

"É aprovada também uma margem adicional de segurança sob a forma de uma garantia do Estado para prever eventuais alterações recentes no valor da parte adquirida pelo Santander Totta, o que eleva o total das potenciais medidas de auxílio para quase três mil milhões de euros." Esta segunda garantia vale 323 milhões.

Em janeiro de 2013, o antigo ministro das Finanças Vítor Gaspar aprovou uma injeção de capital de 700 milhões de euros, já dada como perdida. O Banif beneficiou ainda de 400 milhões em capital híbrido (CoCos), mas não pagou 125 milhões. Mais um peso morto.

Partidos decidem voto hoje

Só hoje é que os partidos vão dizer como votarão amanhã num plenário extraordinário a proposta de Orçamento Retificativo, que o governo entregou ontem no Parlamento. Na conferência de líderes parlamentares foi agendada para amanhã de manhã a discussão e votação no mesmo dia do documento, o que não é inédito.


Com Miguel Marujo

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