terça-feira, 23 de junho de 2015

Negócios da Odebrecht em Portugal sob investigação / Lula demarca-se de Dilma e pede uma "revolução" no PT


Negócios da Odebrecht em Portugal sob investigação
Ligações de Lula da Silva a Ricardo Salgado e José Sócrates voltam à superfície.

MARGARIDA VAQUEIRO LOPES23/06/2015 / Jornal i online

Remonta a Janeiro a informação de que o procurador Rosário Teixeira e a equipa da Autoridade Tributária estão a investigar as relações de José Sócrates com a Odebrecht no âmbito da Operação Marquês. A notícia, avançada pelo i, explicava o porquê: por exemplo, os brasileiros da Odebrecht são os donos da Bento Pedroso Construções, empreiteira que integrou uma série de consórcios vencedores de obras públicas durante os anos em que José Sócrates foi primeiro-ministro. A Bento Pedroso Construções – que só em 2013 passou a chamar-se Odebrecht Portugal, mas já era propriedade dos brasileiros há mais de 20 anos – integrava, por exemplo, o Consórcio Elos, vencedor da construção do troço de TGV entre Poceirão e Caia. Deste consórcio também fazia parte o grupo Lena, no qual foi administrador Carlos Santos Silva – amigo suspeito de ser testa-de-ferro de Sócrates.

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Mas a Odebrecht Portugal integrou também o consórcio que venceu a concessão do Baixo Tejo, da via rodoviária da Grande Lisboa e ainda a construção da barragem do Baixo Sabor, avaliada em cerca de 250 milhões de euros. Recorde-se que a empresa tinha também relações próximas com Lula da Silva – como está descrito no texto ao lado – que, por sua vez, era próximo de José Sócrates. Aliás, o antigo presidente do Brasil esteve em Portugal em Outubro de 2013 para apresentar o livro de Sócrates e não lhe poupou elogios. Quem pagou a viagem do petista? A Odebrecht. A mesma Odebrecht que Lula da Silva elogiou publicamente em Angola, em Maio de 2014, quando aplaudiu a parceria entre empresas brasileiras e angolanas na construção da Companhia de Bioenergia de Angola (Biocom). Da Biocom fazem parte Sonangol e Damer, empresas angolanas e, claro, a brasileira Odebrecht.

BES envolvido O alarme foi dado por Hermes Freitas Magnus, o primeiro delator do Lava Jato, em entrevista ao “Público”, no início do ano. Parte do dinheiro do esquema Lava Jato era lavado através do BES. Segundo Freitas Magnus, José Janene – então líder do Partido Progressista (PP), que foi réu do Mensalão e que entretanto faleceu em 2010 – tinha contas no banco liderado por Salgado. Antes de denunciar o caso em que esteve envolvido, em 2008, Freitas Magnus foi contactado para servir de “mula”, disse à mesma publicação: “Queriam que eu levasse para o Brasil dinheiro de contas do BES, no Porto. As contas eram dele [Janene], para lavar dinheiro em Portugal, mas ouvi dizer que estavam associadas a sociedades offshore”.

No ano passado, o presidente da Andrade Gutierrez desmentiu também Ricardo Salgado, que falou do envolvimento do empresário na compra de dívida do GES pela Portugal Telecom. Otávio Azevedo foi o representante da Oi na PT até Julho do ano passado, mas saiu da operadora alegando que o investimento de 897 milhões de euros da PT em papel comercial da Rioforte não tinha sido aprovado pelo conselho de administração. Apenas mais um ponto de ligação a Salgado.



Lula demarca-se de Dilma e pede uma "revolução" no PT
JOÃO MANUEL ROCHA 23/06/2015 - PÚBLICO

Ex-Presidente critica sucessora e o Partido dos Trabalhadores: "Temos que decidir se nós queremos salvar a nossa pele e os nossos cargos, ou queremos salvar nosso projecto”.

O ex-Presidente do Brasil Lula da Silva tem vindo a demarcar-se de Dilma Rousseff e da actuação do Partido dos Trabalhadores (PT), a que ambos pertencem. “Hoje a gente só pensa em cargo”, disse, na mais recente das declarações críticas que estão a incomodar a sucessora.

“Eu acho que o PT perdeu um pouco a utopia. Eu lembro como é que a gente acreditava nos sonhos, como a gente chorava quando a gente mesmo falava, tal era a crença. Hoje nós precisamos construir isso porque hoje a gente só pensa em cargo, a gente só pensa em emprego, a gente só pensa em ser eleito”, disse, na segunda-feira, em São Paulo, citado pelo jornal O Globo.

“Fico pensando se não está na hora de fazer uma revolução neste partido, uma revolução interna, colocar gente nova, mais ousada, com mais coragem. Temos que decidir se nós queremos salvar a nossa pele e os nossos cargos, ou queremos salvar nosso projecto”, declarou também.

As afirmações foram feitas numa conferência sobre “Novos desafios da democracia”, que incluiu um debate com o socialista ex-presidente do Governo de Espanha, Felipe González, realizado no instituto com o seu nome. Lula disse que tenciona convidar representantes de partidos que têm surgido na Europa, caso do espanhol Podemos. “O PT era, em 1980, o que é hoje o Podemos”, afirmou.

Mas foram as críticas que fez no sábado, num encontro com religiosos católicos, também no seu instituto, quando se referiu concretamente a Dilma e responsabilizou o seu Governo, que estão a incomodar a Presidente do Brasil.

“Dilma está no volume morto, o PT está abaixo do volume morto, e eu estou no volume morto. Todos estão numa situação muito ruim. E olha que o PT ainda é o melhor partido. Estamos perdendo para nós mesmos”, afirmou. A expressão volume morto aplica-se à água do fundo das barragens, que normalmente não se utiliza e que só pode ser captada por bombagem.

Lula declarou na mesma ocasião que o “Governo parece um Governo de mudos” e que é um “sacrifício” convencer Dilma a viajar pelo país defendendo o projecto do PT.

A declaração politicamente mais relevante foi a de que a Presidente quebrou promessas eleitorais. “Tem uma frase da companheira Dilma que é sagrada: ‘Eu não mexo no direito dos trabalhadores nem que a vaca tussa’. E mexeu”, disse. O ex-Presidente considera também “marcante” a quebra do compromisso de não fazer “ajuste”. O “ajuste fiscal” consistiu em cortes nas despesas sociais e em aumentos de impostos e outras receitas.

As críticas desagradaram a Dilma, mas, segundo a Folha de São Paulo, a ordem é para não reagir. O reparo que mais lhe terá desagrado foi a afirmação de que mentiu na campanha quando disse que não haveria alterações nos direitos laborais nem “ajuste fiscal”.

O mesmo jornal escreveu que uma ala do Governo de Dilma interpreta as críticas como um ensaio de distanciamento que permita ao ex-Presidente sobreviver politicamente até às próximas eleições em 2018, em que poderá recandidatar-se. O antigo chefe de Estado estaria, segundo os "dilmistas", a tentar passar a mensagem de que a responsabilidade pela crise política e económica é apenas da actual chefe de Estado.

Dilma está a viver um momento politicamente difícil. A sua popularidade caiu para 10% e a taxa de rejeição do seu Governo atingiu o seu nível mais alto, com 65%, segundo o Instituto Datafolha. É um valor próximo dos 68% de Collor de Mello em Setembro de 1992, pouco antes de ser afastado da Presidência por corrupção. Mas Lula também tem motivos para preocupações. Ele próprio disse há dias que está convencido de que será o próximo alvo da operação Lava Jato, uma investigação à rede de corrupção em torno da Petrobras, a petrolífera nacional, apesar de negar qualquer actuação ilícita.


Aécio Neves, presidente do PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira), derrotado por Dilma nas presidenciais de 2014, não perdeu tempo e aproveitou a boleia das críticas de Lula ao partido e à sucessora. “Acho que o Presidente Lula, mais do que ataques à actual Presidente, sua criatura, tem que reassumir a sua parcela de responsabilidade pelo que vem acontecendo no Brasil. E não há como descolar uma coisa da outra: o governo é o PT, o governo é Dilma, o governo é Lula”

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