sábado, 21 de março de 2015

Grécia promete nova lista de reformas, Juncker liberta fundos

A moral de ter o cofre cheio ou vazio
DIRECÇÃO EDITORIAL 21/03/2015 - PÚBLICO

Alexis Tsipras continua a tentar protelar as reformas, mas os cofres em Atenas estão a ficar vazios.

Tal como aconteceu na Irlanda, a estratégia da troika para Portugal também foi a de sugerir ao país que aproveitasse todas as oportunidades de mercado para construir uma almofada de liquidez que permitisse sair do resgate com alguma segurança. Por isso é que o Estado português chegou a Janeiro deste ano com uma almofada de 24 mil milhões de euros e até já está a usar parte do dinheiro para reembolsar antecipadamente o empréstimo do FMI. Por isso é que esta semana Maria Luís Albuquerque veio dizer uma frase impensável há uns meses: “Temos os cofres cheios.”

É este conforto que permite à ministra dizer que Portugal está escudado, caso tenha de ficar arredado do mercado “durante um período prolongado”. E é este conforto que permite ao Governo português fazer orelhas de mercador às recomendações do FMI, que esta semana veio pedir mais reformas e a continuação da austeridade.

Na Grécia, os cofres já há muito que estão no nível de reserva e se a troika não libertar a última nova tranche de 7,2 mil milhões o país entra em bancarrota até ao final de Abril. E foi numa corrida contra o relógio que Alexis Tsipras chegou neste final de semana à minicimeira de Bruxelas para tentar convencer os parceiros europeus (pelo menos alguns deles) a ajudar a Grécia. Angela Merkel  mostrou quase nenhuma abertura: “Todos os parágrafos do acordo de 20 de Fevereiro continuam válidos.” O máximo que o líder do Syriza conseguiu foi uma ajuda de 2 mil milhões que Jean-Claude Juncker foi desencantar nos cofres dos fundos europeus.

Tsipras enfrenta nesta altura o dilema de quem tem os cofres vazios, ou seja, tem de cumprir a vontade de credores como o FMI, que não se cansa de exigir austeridade. E, quanto mais adia, mais a Grécia arrisca o que os analistas têm apelidado de "Grexident". Os gregos não merecem tamanha austeridade, mas merecem ainda menos uma saída da zona euro, seja acidental ou não.

Grécia promete nova lista de reformas, Juncker liberta fundos
MARIA JOÃO GUIMARÃES e MIGUEL CASTRO MENDES (Bruxelas) 20/03/2015 – PÚBLICO

A mensagem de Bruxelas a Tsipras foi simples: “Dêem-nos uma lista rapidamente, e o dinheiro chegará rapidamente.”

O Governo grego comprometeu-se a apresentar uma nova lista de reformas depois de numa minicimeira na quinta-feira em Bruxelas ter ficado claro que só haveria financiamento adicional depois de medidas concretas.

A chanceler alemã, Angela Merkel, disse que “cada parágrafo do acordo conta”, referindo-se ao acordo com o Eurogrupo de 20 de Fevereiro em que o Governo liderado por Alexis Tsipras prometeu reformas a ser detalhadas mais tarde em troca do desembolso da última tranche do empréstimo da troika. A demora na concretização destas reformas está a causar preocupação em Bruxelas e outras capitais europeias e a deixar responsáveis a falar já não de uma Grexit, a saída da Grécia do euro por decisão política, mas de um Grexident – uma saída descontrolada com mal entendidos e pressões a levarem a um fim da liquidez do país.

O tempo começa a ser a maior preocupação: a Grécia não deverá ter verbas suficientes para chegar a meio do próximo mês sem o dinheiro da última tranche do empréstimo, 7,2 mil milhões de euros, cujo pagamento foi suspenso antes das eleições de Janeiro que deram a vitória à esquerda de Tsipras. A mensagem de Bruxelas foi, no entanto, simples, dizia um responsável sob anonimato à BBC: “Dêem-nos uma lista rapidamente, e o dinheiro chegará rapidamente.”

Merkel mostrou uma ligeira flexibilidade, dizendo que Atenas pode alterar como quiser a sua lista de reformas – “o que é importante é que os números sejam os mesmos”, ou seja, não haja diferenças de poupanças em relação ao anteriormente acordado.

Caso houvesse mudanças, essas teriam de ser analisadas de novo pelo Eurogrupo, o que atrasaria ainda mais o processo.

Tsipras queixava-se após a cimeira que ultimatos e prazos apenas criavam mais pressão, mas no dia seguinte responsáveis de Atenas e Bruxelas citados pelo Financial Times antecipavam que dentro de sete a dez dias o Governo grego apresentará estas medidas. Assim, poderia ser convocado um encontro de emergência do Eurogrupo para a sua avaliação e decidir as condições dos pagamentos.

O primeiro-ministro grego declarou ter saído do encontro muito mais animado, mas comentadores apontavam que o que conseguiu foi ter-se sentado com um clube restrito de decisores (a nível mais elevado do que as reuniões dos ministros as Finanças) e beneficiado de algum baixar da tensão e retórica das últimas semanas.

O facto do encontro ter decorrido apenas com a chanceler alemã, Angela Merkel, o Presidente francês, François Hollande, para além do presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, o líder da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, o líder do Banco Central Europeu Mario Draghi e o chefe do Eurogrupo Jeroen Dijsselbloem e, claro, Alexis Tsipras, deixou, no entanto, furiosos vários líderes de outros países da zona euro: à Bélgica juntaram-se protestos da Holanda e do Luxemburgo.

Apesar disso, a bolsa de Atenas registou uma subida no dia seguinte à minicimeira, que terminou às 2h da manhã (menos uma hora em Lisboa).

Juncker desbloqueia dois mil milhões

Também na sexta-feira, o presidente da Comissão Europeia deu um pequeno presente à Grécia: reconhecendo que o país sofre “uma crise humanitária”, Juncker disse que poderia libertar “dois mil milhões de euros de 2015” de fundos europeus não utilizados para Atenas. Esta verba não seria para entrar nos cofres do Estado grego mas sim para “reforçar os esforços a favor do crescimento e da coesão social”, por exemplo na luta contra o desemprego jovem. Já está a funcionar uma equipa para que a Grécia possa aproveitar melhor fundos estruturais europeus.

Em Atenas, Tsipras falou sobre a reunião e congratulou-se sobretudo pelo reconhecimento de que a Grécia enfrenta uma “crise humanitária”. Quanto ao que foi acordado na minicimeira, repetiu que não vão ser adoptadas medidas “de recessão”.


O próximo grande dia na saga da crise da dívida grega é já segunda-feira, quando Tsipras visita Merkel em Berlim.

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