segunda-feira, 21 de abril de 2014

Muitas contradições no relatório do FMI. O reino da confusão propositada


EDITORIAL
Muitas contradições no relatório do FMI
DIRECÇÃO EDITORIAL 21/04/2014 – PÚBLICO

O FMI faz um relatório que contradiz o que o próprio FMI dizia há apenas alguns meses.
No relatório da 11.ª avaliação do programa de resgate da troika ficámos a saber, por exemplo, que vai haver um novo programa de rescisões para os funcionários públicos menos qualificados, quando ainda há pouco tempo a ministra das Finanças dizia o contrário. E ficámos a saber que a 28 de Março o Governo já assumia perante os credores uma nova fórmula de cálculo das pensões (indexada à economia e à demografia) quando um dia antes Passos Coelho tinha classificado de “especulação” as notícias que davam conta dessa possibilidade.

Mas o relatório não é só sobre contradições entre o que diz o Governo e o que diz o FMI, e vice-versa. É também sobre contradições entre o que diz o FMI hoje e o que dizia o FMI na última avaliação. A propósito do mercado laboral, no relatório da 10.ª avaliação, o Fundo dizia, de uma forma acertada, que “os custos laborais representam apenas cerca de 30% dos custos operacionais” das empresas e, como tal, seria “importante garantir que o peso do ajustamento não recaia demasiado no trabalho e seja contrabalançado com ajustes noutras áreas”. Poucos meses volvidos, o FMI vem dizer precisamente o contrário, ou seja, que o Governo precisar de ir mais além na liberalização do mercado de trabalho.

O FMI diz, por exemplo, que houve mudanças na lei para facilitar os despedimentos, mas que as empresas continuam a não despedir. Será que o FMI não concebe que as empresas possam não querer despedir? Será que o FMI não ouve os próprios patrões, como António Saraiva, que ainda ontem veio dizer que a legislação laboral não está a ser um empecilho para as empresas?

E o FMI continua a insistir na necessidade de baixar as indeminizações dos despedimentos ilegais. Isso não contraria a Constituição, que proíbe os despedimentos sem justa causa?

O reino da confusão propositada
Por Eduardo Oliveira Silva
publicado em 22 Abr 2014 in (jornal) i online

É a fase em que se atiram números e medidas para aturdir cidadãos
O que se passou ontem com a catadupa de números atirados ao mesmo tempo para cima do país é o contrário da transparência que a democracia pressupõe.

Paulo Portas foi ao parlamento confirmar aspectos positivos relacionados com a 11.a avaliação, que terminou há dois meses, exactamente no momento em que o FMI dava a conhecer o seu relatório sobre a mesma matéria com mais uma série de recomendações drásticas, enquanto a União Europeia nada dizia do tema relativamente ao qual tem também obrigação de se pronunciar.

Nada disto é casual. O relatório do FMI estava distribuído com embargo desde sexta-feira, a data da ida de Portas foi criteriosamente escolhida e a troika chega hoje a Lisboa para a última avaliação, que coincidirá de novo com feriados simbólicos, o que tem algo de recorrentemente provocatório.

O espectáculo dado pelo vice-primeiro-ministro, apimentado com o facto de a oposição nem sequer ter acesso aos relatórios todos, foi triste de ver. Percebemos que o governo se limita a gerir o timing de aplicação das exigências que o documento do FMI ilustra ao apontar novamente matérias como a legalização do despedimento sem justa causa ou mais um conjunto de cortes nas pensões públicas, ao mesmo tempo que passam os das privadas de provisórios a permanentes. Tudo sem sequer ter havido o decoro de esperar pelo parecer da comissão nomeada para estudar o assunto. Isto para não falar na manutenção dos aumentos brutais de impostos, na anulação dos suplementos da função pública e no anúncio de que a TAP (a última jóia da coroa) é mesmo para privatizar.

Pelo meio, lá se vai reafirmando que o crescimento será de cerca de 1,2%. Pudera! Depois de tanta penalização em termos de emprego, de poder de compra, de perda de direitos sociais, qualquer folga ou investimento gera um efeito positivo.

Um mosaico chamado AICEP

A formação da administração da AICEP baseia-se num conjunto de princípios que justificam perplexidade e suscitam uma dúvida legítima quanto à eficácia de que o país necessita.

O organismo a que Miguel Frasquilho vai presidir tem, além do seu presidente, um conjunto de administradores oriundos cada um do seu ministério. Passos Coelho escolhe um, Portas indica outro, Pires de Lima um terceiro. O MNE também mete a colherada, não esquecendo que os próprios quadros do AICEP têm igualmente uma palavra a dizer.

A questão não é inédita, uma vez que se trata de um modelo que se encontra reproduzido em muitas outras organizações do Estado, entre empresas, institutos e até bancos, como por exemplo a Caixa Geral de Depósitos e o do Fomento, que agora nasce.

No caso da AICEP há nota de que algumas empresas exportadoras de sectores efectivamente competitivos se têm sentido desacompanhadas na procura de novos mercados, o que aconselharia uma mudança de método em benefício da escolha de uma equipa mais ligada à economia real.


Não aproveitar a saída de Pedro Reis para modificar a regra de constituição da equipa e manter o seu modelo de indigitações "corporativas dentro do Estado" é claramente perder uma oportunidade de melhorar o contributo da AICEP para a economia, o qual - reconheça-se mesmo assim - tem sido positivo.

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