quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Portugal leva proposta a Bruxelas para exportar energia renovável para a UE. Quase 60% da electricidade consumida em 2013 foi de origem renovável.


Portugal leva proposta a Bruxelas para exportar energia renovável para a UE
Governo quer prioridade para investimento nas interligações da Península ao resto da Europa e calcula que o país tem um potencial eólico quatro vezes superior à sua capacidade actual
A União Europeia não conseguirá atingir as novas metas de clima e energia para 2030, a custos suportáveis para os consumidores, se não comprar energia renovável a Portugal e Espanha, países mais abundantes em vento e sol e, por isso, mais baratos para produzir. É este o motivo de base que o Governo português apresenta para a proposta inédita que enviou esta semana à Comissão Europeia e que pode levar o país a tornar-se exportador de energia renovável para a UE.
Lurdes Ferreira / 17 jan 2014 / Público

Terça-feira passada, o ministro do Ambiente e da Energia, Jorge Moreira da Silva, enviou aos comissários europeus com as respectivas áreas uma carta em que propõe uma meta vinculativa de 25% de capacidade de interligação das redes eléctricas entre todos os Estados-membros até 2030. “É um assunto prioritário”, diz, dada “a necessidade de transferência física, entre Estadosmembros, da electricidade produzida de fontes renováveis”, a custos eficientes.
A meta defendida significa, na prática, que a UE deve ter “autoestradas” de electricidade com espaço suficiente para deixar circular 25% da capacidade de produção instalada em todo o seu território dentro de 16 anos. Como meta intermédia para 2020, defende 12% e, “no muito curto prazo”, 10%. “Se a política europeia para 2030 quer impulsionar o uso de energias renováveis, isto significa que precisamos de um roteiro” para as interligações, escreve o ministro.
Nos últimos meses de negociações para o novo pacote Clima e Energia 2030, o Governo português tem defendido a adopção de uma quarta meta vinculativa, em cimeiras de chefes de Governo e de Estado da UE e da OCDE, de forma a que o assunto deixe de ser uma preocupação apenas portuguesa e espanhola a passe a ter âmbito comunitário.
Em Dezembro passado, na votação do relatório do Conselho de Energia sobre o Mercado Interno de Energia, Portugal chegou a ameaçar veto, por o documento nada propor quanto ao atraso crónico na interligação entre a Península Ibérica e a França. A Península Ibérica era apenas retratada como a “excepção” na lista de projectos de interesse comum da UE e que não atingiria a meta no prazo previsto. No final, a versão aprovada mostra que os Vinte e Oito concordaram que “deve ser dada prioridade aos Estados-membros que estão mais longe de atingir a meta”, requerendo-se “investimento significativo” nestas infra- estruturas.
Outra carta que os ministros da Economia, Energia e Ambiente de oito países da UE escreveram em vésperas de Natal, entre os quais a Alemanha, França, Itália e Portugal, em defesa de metas ambiciosas para o consumo de energia renovável (40%), também refere por duas vezes a necessidade de “aumentar a capacidade de interligações” para que os compromissos sejam cumpridos.
Nas metas actuais, que constam da chamada lista de Projectos de Interesse Comum (PCI) que define as redes transeuropeias prioritárias para a UE, o objectivo de interligação da Península Ibérica é de apenas 4%, encontrando- se em 1,6% neste momento. Portugal considera-a insuficiente para a ambição das metas de clima e energia que têm sido discutidas, apesar de o acordo vir longe.
Na missiva de terça-feira, o Governo reafirma que está do lado das metas mais exigentes para 2030: redução das emissões domésticas de dióxido de carbono em 40%, em relação a 1990, 40% do consumo de energia a partir de fontes renováveis, 30% de aumento de eficiência energética, a que junta a quarta meta, de 25% nas interligações.
Os primeiros cálculos de que o Governo dispõe, segundo apurou o PÚBLICO, dizem apenas respeito ao potencial eólico adicional. Estes indicam que Portugal tem condições naturais para ter quatro vezes mais capacidade instalada do que a actual (de 5 gigawatts (GW) para 20), e Espanha tem potencial para cinco vezes mais (de 25 GW para 100 GW), de acordo com dados desenvolvidos pela Direcção-Geral de Energia e Geologia e pela Agência Portuguesa do Ambiente.
Com o estrangulamento histórico que impede a circulação de energia eléctrica da Península Ibérica para França, e daí para o resto da Europa, Portugal pede aos seus parceiros europeus que levem a sério este assunto, ao fim de décadas perdidas a que a França resistiu. Os novos corredores de electricidade para a Europa podem também atrair investimento, empresas e emprego.
Interesses distintos
A discussão sobre a quantidade e a ambição das metas vinculativas do novo pacote de clima e energia, que vão de 35% a 40%, têm dividido os países e a Comissão Europeia. Países como a Polónia e o Reino Unido defendem apenas uma meta, de modo a terem margem de manobra para explorar carvão e gás xistoso. Os ingleses alegam ainda que as novas linhas de alta tensão vão encarecer a energia eléctrica. Às três metas tradicionais que estão em cima da mesa — redução das emissões de CO2, consumo de energia de fontes renováveis e eficiência energética —, Portugal acrescentou à discussão uma quarta: 25% de capacidade de interligação eléctrica.
A Comissão deverá divulgar o Livro Branco do Pacote Clima e Energia 2030 no próximo dia 22 de Janeiro, mas tudo fica para mais tarde, para o executivo comunitário que se segue, tendo pela frente cerca de dois anos de negociação até as novas metas chegarem a lei.



Em 2013, a produção de electricidade a partir do vento aumentou 20%P
Quase 60% da electricidade consumida em 2013 foi de origem renovável
MARISA SOARES 14/01/2014 – in Público
Meteorologia explica aumento do peso das renováveis no consumo de energia eléctrica.

Portugal bateu recordes em 2013 no que toca à energia renovável: 58,3% da energia eléctrica consumida no ano passado foi produzida por fontes renováveis, o que representa um aumento de 20% em relação ao ano anterior. Esta variação permitiu diminuir a electricidade importada em 2,8 vezes, segundo a Quercus.

A associação ambientalista, que cita os dados mais recentes da produção de electricidade em Portugal Continental publicados pela Redes Energéticas Nacionais (REN), nota que, considerando apenas a produção nacional, a contribuição das renováveis chegou ao “valor recorde” de 61,7% da electricidade consumida.

A diferença entre os valores de 2012 e de 2013 está relacionada com a meteorologia: 2012 foi um ano muito seco, 58% abaixo da média, segundo a Quercus. Em contrapartida, 2013 foi “relativamente húmido”, 17% acima da média. Por isso, a produção de electricidade renovável da grande hídrica, com recurso às barragens, mais do que duplicou no ano passado.

Também o vento soprou mais forte em 2013, levando a um aumento de quase 20% na produção de electricidade a partir desta fonte. “Na fotovoltaica, o aumento da capacidade instalada permitiu um aumento de 25% em relação a 2012, apesar de ainda não ter atingido 1% do consumo, o que revela um enorme potencial de crescimento”, nota a Quercus, num comunicado assinado também pela Associação Portuguesa de Energias Renováveis (Apren).

Nessa nota, Francisco Ferreira, coordenador do grupo de energia e alterações climáticas da Quercus, sublinha que a aposta nas energias renováveis e na eficiência energética “permite a recuperação da economia sem onerar o ambiente”, pelo que defende a continuação da aposta neste sector. “É preciso um investimento na sensibilização e um planeamento adequado do sector energético também em prol de uma desejável política climática exigente", defende.

António Sá da Costa, presidente da direcção da Apren, também citado no comunicado, salienta que, além da diminuição das importações de combustíveis fósseis e de emissão de gases com efeitos de estufa, o reforço do peso das renováveis na electricidade consumida “possibilitou estabilizar o preço deste bem, o que também é positivo para ajudar Portugal a sair da crise”.

Segundo as duas associações, a aposta nas renováveis permitiu poupar cerca de 850 milhões de euros em 2013: 806 milhões de euros na importação de combustíveis fósseis (gás natural e carvão) e 40 milhões de euros em licenças de emissão de dióxido de carbono (CO2).

Entre 2012 e 2013 verificou-se uma redução nas emissões de CO2 na ordem das 2,3 milhões de toneladas, refere a nota. Deste total, um milhão de toneladas deve-se à redução do recurso às centrais a carvão.


Este aumento do peso das renováveis no consumo de energia tem, porém, outro lado menos positivo para os consumidores, que este ano vêem aumentar as tarifas eléctricas em 2,8% (ou em 1% para os consumidores com tarifa social). Isto porque a produção de electricidade de origem renovável em regime especial (toda a renovável à excepção das grandes barragens) - que tem prioridade na entrada na rede - aumentou mais do que o previsto (chegou aos 32% em Portugal Continental, mais 5% do que em 2012), fazendo disparar os custos com as energias eólica e hídrica, co-geração e gás natural em 2013, e contribuindo para um aumento do défice tarifário, que deverá chegar aos 4,4 mil milhões de euros no final de 2014, segundo os cálculos da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos.

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