sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Cavaco diz que é fundamental que autoridades guineenses apurem. Presidente da TAP admite que houve “ordens superiores” para embarcar passageiros sírios. Bissau não garante ainda condições de segurança a voos da TAP.


Cavaco diz que é fundamental que autoridades guineenses apurem responsabilidades
ANA HENRIQUES , MARGARIDA GOMES e LUSA 12/12/2013 - 15:44 (actualizado às 18:05) in Público

Governo guineense lamenta incidentes com passageiros que SEF não tem a certeza de serem mesmo sírios. Ministro dos Negócios Estrangeiros guineense tem esperança que ligação aérea seja reposta já este sábado.

O ministro dos Negócios Estrangeiros da Guiné, Delfim Silva, lamentou nesta quinta-feira o incidente que rodeou a vinda para Portugal, via aeroporto de Bissau, de 74 cidadãos alegadamente provenientes da Síria, com passaportes turcos falsos. Na sequência deste caso, que a Comissão Europeia diz não ter precedentes, a TAP cancelou os voos para a capital guineense. Já o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras tem dúvidas sobre a nacionalidade das 21 crianças, 15 mulheres e 38 homens, que à chegada pediram asilo humanitário a Portugal.

Já esta quinta-feira à tarde, à margem de uma jornada dedicada ao empreendedorismo social, no Porto, o Presidente da República português considerou que o embarque em Bissau de 74 passageiros com documentos falsos num voo para Lisboa "transcende Portugal", afirmando ser "fundamental que as autoridades guineenses apurem os responsáveis pelas acções que foram desenvolvidas".

Cavaco Silva disse ainda ter sido informado da situação quando estava reunido com o ministro Rui Machete. "O senhor ministro dos Negócios Estrangeiros estava comigo e quando recebeu a informação imediatamente me comunicou e trocámos impressões sobre aquilo que, da parte política, devia ser feito", respondeu, quando questionado pelos jornalistas se tinha sido informado previamente.
O chefe de Estado português disse ainda que "a primeira condição para as ligações aéreas entre dois países é a segurança dos aeroportos": "Não foi garantida a segurança do aeroporto numa ligação aérea com Lisboa. É óbvio que isso é observado pelas múltiplas companhias aéreas do mundo inteiro."

Do lado guineense, o ministro dos Negócios Estrangeiros do Governo de transição, Delfim da Silva, manifestou ao PÚBLICO estar optimista. “Tenho esperança de que as ligações aéreas da TAP entre Lisboa e Bissau recomecem já no sábado, porque os cidadãos que querem viajar é que saem prejudicados”, declarou, muito embora admitindo que não há negociações em curso que permitam dizer se isso poderá, efectivamente, acontecer.

Sobre o facto de a Comissão Europeia se poder vir a pronunciar sobre o incidente, Delfim da Silva diz que o sucedido com o voo da TAP, apesar de grave e lamentável, “é uma ninharia”, se comparado com episódios como aqueles em que “há pessoas a morrer às portas da Europa” - numa referência aos imigrantes ilegais africanos que chegam a Lampedusa.

Da parte do Governo português, o ministro da Presidência, Marques Guedes, afirmou esta quinta-feira que a suspensão dos voos para Bissau foi motivada por uma situação "completamente incontrolável e inadmissível" de embarque forçado. "Houve um forçar por parte das autoridades no local ao comandante do avião para o embarque daquelas pessoas, sendo certo que havia manifestamente uma falsificação grosseira dos seus documentos de viagem", resumiu o governante no final da reunião do Conselho de Ministros. Os contornos do episódio estão a ser averiguados e a situação dos portugueses que se encontram na Guiné-Bissau a ser acompanhada pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros.

Questionado sobre a atribuição ou não do estatuto de refugiados aos passageiros que embarcaram para Lisboa, Marques Guedes respondeu: "A concessão obedece a procedimentos legais próprios, não é algo que se possa conceder nem instantaneamente, nem em 24 horas. Obedece a procedimentos administrativos próprios e que estão naturalmente a ser prosseguidos, a partir do momento em que houve requerimentos nesse sentido."

"Lamentamos o sucedido, vamos apurar responsabilidades e tirar consequências", declarou o ministro do Governo de transição guineense Delfim Silva, depois de um encontro com o encarregado de negócios da embaixada portuguesa, Teles Fazendeiro, acrescentando ainda: "O que aconteceu não é do interesse da Guiné-Bissau, não ajuda ninguém, não ajuda as relações com Portugal, nem os nossos compatriotas em Portugal.” O governante disse ainda que a situação também “não ajuda às relações com a Europa".

O porta-voz da Comissão Europeia, Olivier Bailly, declarou, por seu turno, durante a conferência de imprensa do executivo que o caso do voo Bissau-Lisboa não tem precedentes.

“Haverá provavelmente uma resposta consolidada” da União Europeia sobre o assunto – que, como é invulgar e envolve diferentes ângulos, exige uma coordenação de posições entre os serviços da Comissão e o Serviço Europeu de Acção Externa. "Há diferentes ângulos. Há a legislação relativamente aos pedidos de asilo de refugiados, mas há também o ângulo da relação bilateral entre um dos nossos Estados-membros e um país terceiro, pelo que precisamos de coordenar posições”, concretizou Olivier Bailly. A União Europeia não reconhece as autoridades de transição da Guiné-Bissau que saíram do golpe de Estado de Abril de 2012.


Segundo uma fonte do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, alguns dos passageiros que entraram em Portugal com passaportes turcos falsos apresentaram às autoridades fotocópias de documentos que supostamente comprovariam a sua nacionalidade síria. No entanto, as fotocópias não terão convencido totalmente os inspectores do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, que têm suspeitas sobre a sua verdadeira nacionalidade.


Presidente da TAP admite que houve “ordens superiores” para embarcar passageiros sírios
RAQUEL ALMEIDA CORREIA (em Viena) e ANA CRISTINA PEREIRA 13/12/2013 – in Público

Companhia ainda tem mil reservas para Bissau por resolver já na próxima semana.
O presidente da TAP admitiu nesta sexta-feira que houve “ordens superiores” para terça-feira de madrugada embarcar os 74 passageiros sírios em Bissau, o que levou à suspensão da rota por parte da companhia de aviação portuguesa.

À margem da reunião anual da Star Alliance, onde se encontram todos os responsáveis máximos das transportadoras aéreas que integram a aliança, Fernando Pinto quis deixar claro que “não houve demonstração de força perante a tripulação”, com se tem especulado. O gestor brasileiro esclareceu que “a maior pressão foi feita sobre o chefe de escala”, responsável pela ligação entre Bissau e Lisboa.

Questionado sobre o tipo de pressão exercido, o presidente da TAP disse que “vieram ordens superiores para embarcar”, com a ameaça de que, se tal não sucedesse, “o avião ficaria retido”. Fernando Pinto preferiu, no entanto, não especificar de quem vieram essas ordens.

Ontem, o ministro dos Negócios Estrangeiros da Guiné-Bissau, Delfim da Silva, já tinha comentado: “Não estou a ver gente com armas a obrigar a tripulação a embarcar os passageiros”.  Hoje, disse: "São detalhes que vão demorar a ficar esclarecidos." Uma comissão de inquérito foi já anunciada pelo primeiro-ministro.


Os ânimos ainda não serenaram entre todos os passageiros da TAP com viagens marcadas num sentido ou noutro. A companhia já conseguiu encontrar voos alternativos para cerca de 500 passageiros que tinham reservas esta semana, através de uma parceria com a Air Senegal. No entanto, ainda há cerca de 1000 passageiros com viagens marcadas para a próxima semana e que estão por resolver.

“Temos uma equipa especial na TAP a tratar esta questão”, disse o gestor, explicando que, além da alternativa do Senegal, foram “colocados voos adicionais em Dakar e também foi dada a possibilidade de fazer [a viagem] via Marrocos”. De qualquer forma, esta situação irá comportar custos adicionais para a transportadora aérea nacional, além do facto de poder vir a ser multada por transportar passageiros com documentos inválidos. Fernando Pinto garantiu que a empresa “vai recorrer da multa”.

Até à suspensão dos voos, a TAP voava três vezes por semana para Bissau. Uma ligação tradicional da companhia, mas sem rentabilidade elevada. “É uma rota equilibrada” financeiramente, disse Fernando Pinto, apesar de acrescentar que acredita que “um dia vai crescer”.

A companhia não descarta a hipótese de retomar os voos, mas apenas “se não voltarem a acontecer situações deste tipo”, referiu o gestor, frisando que “o aeroporto tem de oferecer uma condição de conforto à empresa”. Quanto às negociações que estarão a decorrer entre os governos dos dois países para resolver a situação, o presidente da TAP não quis responder por se tratar de um “assunto de Estado”.

Uma das soluções poderá ser retomar o apoio do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) em Bissau. Até há um ano, era desta forma que funcionava a operação da TAP no país, mas “foi proibido pelas autoridades locais”, adiantou Fernando Pinto. “Agora há a hipótese e esse seria um caminho inteligente”, admitiu.

Delfim da Silva já admitiu a possibilidade de reactivar o protocolo, que vigorou ao longo de 2012, de forma a ultrapassar o problema que este episódio criou entre os dois países. Conforme o acordo, inspectores do SEF faziam um controlo de passageiros à entrada do avião. Por esta via, as autorizades portuguesas terão conseguido reduzir de forma significativa a entrada de cidadãos oriundos da Guiné-Bissau com documentos falsos em território nacional. Findo o acordo, tudo terá regressado à estaca zero. 


A jornalista viajou a convite da Star Alliance

“Michele Cerccone, porta-voz da comissária que trata da política de asilo, lembrou ontem haver dois aspectos a ter em conta: “Por um lado, a legislação da UE que se aplica aos pedidos de asilo”; por outro, “a forma como estas pessoas entraram em Portugal”. Sobre este último aspecto, pediria ao Serviço Europeu de Acção Externa que se pronunciasse, já que em jogo estão as relações entre um país da UE e um país terceiro. Outro porta-voz, Olivier Bailly, adiantou que mais tarde apresentariam uma posição “mais consolidada”. “Obviamente, trata-se de uma situação sem precedentes.” Ao que o PÚBLICO apurou, o Serviço Europeu de Acção Externa deverá abster-se.”

Guiné-Bissau não garante ainda condições de segurança a voos da TAP
Companhia aérea portuguesa conseguiu negociar com a Air Senegal pelo menos dois voos, para garantir as viagens dos passageiros entretanto canceladas. Caso começa a assumir contornos políticos
Ana Cristina Pereira e Ana Henriques in Público

A suspensão dos voos da TAP entre Lisboa e Bissau está a assumir fortes contornos políticos. A TAP diz-se interessada em retomar as ligações regulares com a capital da Guiné assim que haja condições de segurança, mas, pelo menos por ora, o Governo transitório não está capaz de lhas garantir.
Citado pela Lusa, o ministro da Presidência, Marques Guedes, considerou a situação “completamente incontrolável e inadmissível”. “Houve um forçar por parte das autoridades no local ao comandante do avião para o embarque daquelas pessoas, sendo certo que havia manifestamente uma falsificação grosseira dos seus documentos de viagem”, sustentou.
Embora as investigações persistam, o ministro dos Negócios Estrangeiros da Guiné-Bissau, Delfim da Silva, disse ao PÚBLICO que duvida que homens armados tenham forçado o chefe de escala e a tripulação da TAP a embarcar os 74 sírios: “Não estou a ver gente com armas a obrigar a tripulação a embarcar os passageiros”. O mesmo membro do Governo saído do golpe de Estado de Abril de 2012 admite, todavia, a existência de “grande falha de segurança” no embarque.
Para que a TAP possa voltar a voar para Bissau o mais depressa possível, Delfim da Silva defende a reactivação do acordo de cooperação entre os dois países. É uma clara contradição com a posição que o ministro que, por norma, exerce a função de porta-voz tomara ainda na véspera. Fernando Vaz dissera então ao PÚBLICO que a suspensão dos voos poderia custar à TAP a autorização para voar para a Guiné.
Há duas formas de ver o que aconteceu, comenta Carlos Silva, responsável pela organização nãogovernamental Acção para o Desenvolvimento (AD). Uma, a de Fernando Vaz, protagoniza uma espécie de corrida para o abismo e outra, a de Delfim da Silva, é mais cautelosa. “Isto é o isolamento completo. Este é o único voo regular para a Europa”, explica. Ainda há seis meses, o aeroporto de Bissau estava na lista negra internacional. “Aumenta o isolamento político que já existe e que tem vindo a crescer.”
No Porto, Cavaco Silva declarou ser “fundamental que as autoridades guineenses apurem os responsáveis pelas acções que foram desenvolvidas”. “A primeira condição para as ligações aéreas entre dois países é a segurança dos aeroportos”, comentou. “Não foi garantida a segurança do aeroporto numa ligação aérea com Lisboa. É óbvio que isso é observado pelas múltiplas companhias aéreas do mundo inteiro.”
A TAP diz-se interessada em retomar as ligações logo que a Guiné-Bissau lhe dê as condições de segurança exigidas pelas autoridades portuguesas. “Não posso garantir isso porque são questões que passam pelo ministro da Segurança Interna”, afiança Delfim da Silva. O Conselho de Ministros guineense já discutiu o assunto duas vezes.
Nos aeroportos de Bissau e de Lisboa notou-se ao longo de ontem o rodopio de quem tem voos para apanhar. O porta-voz da TAP, António Monteiro, anunciou ao final do dia que a companhia aérea tinha conseguido negociar com a Air Senegal pelo menos dois voos para garantir as viagens dos passageiros entretanto canceladas.
Um voo da TAP partirá de Lisboa amanhã. Em Dakar, os passageiros serão transferidos para um aparelho da Air Senegal, que os deixará em Bissau no domingo de madrugada. Nesse mesmo dia, haverá um voo de regresso. Se o problema se estender, a TAP contratará mais serviços deste género.
“O que aconteceu não ajudou ninguém e muito menos a Guiné”, reconheceu Delfim da Silva. “Estamos numa situação delicada e queremos compor as relações com todos os países”, disse ainda, acrescentando que os funcionários do aeroporto de Bissau “podem falhar e ser até vulneráveis a algumas situações”.
Teme-se, na Guiné-Bissau, que haja consequência em Bruxelas. Michele Cerccone, porta-voz da comissária que trata da política de asilo, lembrou ontem haver dois aspectos a ter em conta: “Por um lado, a legislação da UE que se aplica aos pedidos de asilo”; por outro, “a forma como estas pessoas entraram em Portugal”. Sobre este último aspecto, pediria ao Serviço Europeu de Acção Externa que se pronunciasse, já que em jogo estão as relações entre um país da UE e um país terceiro. Outro porta-voz, Olivier Bailly, adiantou que mais tarde apresentariam uma posição “mais consolidada”. “Obviamente, trata-se de uma situação sem precedentes.” Ao que o PÚBLICO apurou, o Serviço Europeu de Acção Externa deverá abster-se.
Confrontado com esta movimentação, Delfim da Silva reconhece que o embarque forçado constitui “um episódio muito grave e lamentável”. Apesar de tudo, diz que não passou de uma “ninharia”, se comparado com outros episódios como o dos africanos a morrer às portas da Europa.
Os 74 cidadãos estrangeiros, que formam diversas famílias, requereram o estatuto de asilo político a Portugal. O processo pode arrastarse uns dois meses. O SEF começou ontem a ouvir os 51 adultos e os 23 menores, que estão alojados em instalações cedidas pela Segurança Social. Como traziam passaportes contrafeitos, as autoridades terão de documentar as suas verdadeiras identidades. com Margarida Gomes e Isabel Arriaga e Cunha, em Bruxelas

Sem comentários: