sábado, 7 de setembro de 2013

Bombeiros exigem acessos na mata do Gerês para poderem chegar aos fogos.


Bombeiros exigem acessos na mata do Gerês para poderem chegar aos fogos


Comandante dos Voluntários de Terras do Bouro critica direcção do Parque Nacional, que impede abertura de caminhos. Bombeiros têm sido levados até aos fogos de helicóptero. De noite, é deixar arder
José Dias aponta para as longas encostas dos quase 70 mil hectares do Parque Nacional da Peneda-Gerês (PNPG) e parece difícil acreditar nele quando diz que os bombeiros às suas ordens já as subiram e desceram vezes sem conta atrás das chamas. "Já estivemos ali e também fomos ali. Somos quase montanhistas. A verdade é que caminhamos e escalamos", graceja o comandante dos Bombeiros Voluntários de Terras de Bouro.
As encostas profundamente inclinadas já foram amiúde trilhadas pelos seus homens, com o peso do material de sapador e da enxada às costas. Contemplando a paisagem do único parque nacional do país, compreende-se que aquele trabalho dos bombeiros pode ser uma missão hercúlea. "Já houve vezes em que, sem helicóptero, andámos duas horas a pé até chegar ao incêndio. Outras, de noite, nem vale a pena. Deixamos arder até que haja helicóptero", diz o responsável, ali bombeiro há 28 anos.
José Dias está "farto" de ver os seus voluntários caminharem tantas horas e até caírem pelos montes. "Ainda na semana passada um se aleijou e foi para o hospital", recorda. Garante que não vai deixar de rasgar os vales, mas exige aos responsáveis do PNPG que "não pensem tão exageradamente no proteccionismo da zona" e abram, "pelo menos, alguns caminhos", como "os que existem no lado de Espanha", para que seja "possível fazer chegar viaturas a algumas áreas".
Na terça-feira, um fogo deflagrou na área do PNPG, em Curral, Campo do Gerês, Terras de Bouro. Alguns bombeiros só lá conseguiram chegar transportados por helicóptero, segundo José Dias. Outros caminharam. Em conjunto com uma equipa do Grupo de Intervenção de Protecção e Socorro (GISP) da GNR e equipas do PNPG, demoraram três dias a apagá-lo. "Temos de pedir que o helicóptero venha de Braga e faça o favor de nos levar. Se for de noite, não temos helicóptero. Por vezes, mais vale deixar arder até que nasça o dia", explica o comandante dos Bombeiros de Terras de Douro.
O responsável operacional, que guiou o PÚBLICO por algumas zonas do parque, sugere caminhos em três locais: nos Carris, onde já existiu um acesso antigo que se foi fechando, sem manutenção, pela acção da natureza; na área da "Pedra Bela"; e próximo da Mata de Albergaria. "Já alerto os responsáveis do PNPG para isso há anos. Diz-se, e bem, que o parque é a jóia de Portugal. Querem tanto proteger que, depois, não fazem nada para criar condições aos bombeiros", lamenta. "Percebo e defendo que se deve proteger isto ao máximo, mas tem haver equilíbrio e acessos apenas para bombeiros em casos de emergência", defende ainda.
Quercus discorda
A Quercus, que na terça-feira emitiu um comunicado a apelar ao reforço de meios para combater o incêndio que lavrava naquele dia, num "local de difícil acesso" com "habitats prioritários como os bosques de teixo, azevinho e azereiro", defende, em alternativa, a criação de faixas de contenção. "Abrir caminhos não é a melhor solução para aquela zona que, aliás, tem muita pedra. O melhor seria criar faixas de contenção através de moto-roçadoras, após algum estudo dos melhores sítios, tal como existe no lado espanhol", diz Domingos Patacho, coordenador da Quercus para a área das florestas.
Este engenheiro florestal, que admite no máximo a consolidação do antigo caminho de Carris, sublinha, porém, que estes são trabalhos "caros", o que, por vezes, leva a que "não sejam feitos". Segundo o especialista, as faixas de contenção - espaços abertos após o corte de mato - também podem ser usadas "com segurança" por "bombeiros apeados", embora não por viaturas.
Domingos Patacho, que elogia o trabalho dos bombeiros, diz que este tipo de incêndios em área protegida "tem, pela sua especificidade, de ser combatido por profissionais". "Não quero, com isto, criticar o trabalho dos voluntários, mas é necessário um alto grau de especialização neste combate para se conseguir apagar um incêndio sem água, apenas com os instrumentos de sapador e contra-fogo", defende o engenheiro florestal para quem, nesta zona, os bombeiros deveriam ter "mais formação". Além disso, o responsável da Quercus insiste que a melhor forma de actuar nestes incêndios é mesmo "com brigadas helitransportadas" e, nomeadamente, elementos dos GISP da GNR, "que têm elevada formação".
O PÚBLICO enviou várias questões ao director do PNPG. Contudo, as respostas de Rogério Rodrigues, que é também director regional das Florestas do Norte, não chegaram em tempo útil.

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